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AMIGOS DA PESCA

PESCA DE PRAIA

          por Rubens Gonçalves da Silva

 

Quando eu comecei a pescar em praias, ainda criança,  usava um carretel improvisado com linha, amarrava uma chumbada na ponta e dois anzóis amarrados com dois nós simples formando uma pernada bem "sem-vergonha". Colocava camarões nos anzóis, girava esse chicote e arremessava até onde fosse possível, sem escolher local. Pescava a qualquer hora do dia, seja em tempo nublado ou ensolarado, sempre com camarão morto. E pescava muito! Se colocasse só a cabeça do camarão no anzol com certeza apareceria um "guloso" que seria fisgado facilmente depois de pouco tempo! Havia muitos peixes, muita fartura.  Eram outros tempos...

 

Com a urbanização da faixa litorânea, ocorreu a disseminação da pescaria de praia. E, pouco a pouco, o aumento gradativo da quantidade de pessoas, a sujeita proveniente das cidades, o aumento da pescaria profissional, foram diminuindo a fartura de peixes nas praias. Hoje, uma pescaria necessita de mais técnica, equipamento mais adequado, e mais conhecimento do local.

 

Por isso eu pretendo contribuir com os apreciadores de uma boa pescaria com este artigo que, através de uma abordagem simples, contém toda minha experiência sobre essa agradável forma de interagir com a natureza, de "brigar" com os peixes em suas fisgadas emocionantes: a puxada brusca, as inesperadas corridas em ziguezague na tentativa de escaparem, o peso que às vezes dá a impressão que vai arrebentar a linha, e a agradável surpresa do vulto do peixe chegando em meio às ondas, depois de um bom tempo de "luta". Este é um esporte e tanto!

 

Quando eu consegui condições de trocar os carretéis de linha por varas de fibra e molinete, foi uma farra: em uma loja de pesca comprei tudo o que havia de novidades para incrementar meu equipamento. Naquela época não haviam manuais de pesca, internet ou outra forma de troca de conhecimentos; além disso, haviam muitos acessórios desenvolvidos sem um critério técnico. Porém, como era novidade, a empolgação falava alto para usar e conhecer. E, como a quantidade de peixes já não era mais a mesma de outrora e aquele monte de acessórios eram novidade, eu imaginava que quanto mais incrementado meu equipamento, maiores seriam minhas chances de capturar "monstros", como costumamos dizer entre os pescadores.

 

Enfim, chegou a grande hora. Vara de fibra de vidro maciça (eram comuns naquela época), molinete Super Paoli, linha 0,30 mm, anzóis adequados com camarões mortos sem cabeça, chumbada pirâmide na ponta e - aí vem as novidades: giradores, engates de aço rígido, miçangas, emendas de aço, snaps, pernadas de cabo de aço, penduricalhos coloridos para atrair os peixes... Bem, imagine uma árvore de Natal presa na ponta de linha. Era isso que eu havia montado.

 

Entrei orgulhoso na praia, imaginando estar prestes a atrair todos os peixes para meu "poderoso" chicote. Esperei minutos... e nada. Recolhia, trocava a isca, voltava...nada novamente. Depois de muito tempo, bateu aquela frustração; afinal, o que estava errado? Será que faltava mais algum incremento que eu não havia encontrado na loja de pesca?

 

De repente, de longe, um senhor com camisa quadriculada aberta e mangas arregaçadas, bermuda listrada, um grande chapéu  de palha e um equipamento simples, veio na minha direção. Pensei eu: "Já era hora de alguém vir tirar uma da minha cara, mas tinha que ser um caipira?" Enganei-me totalmente. Aquele homem, um italiano há muitos anos no Brasil e adorador de pesca de praia, apresentou-se gentilmente e fez críticas construtivas ao meu equipamento e à forma como eu pescava. Para começar, disse para eu pegar todos aqueles penduricalhos e jogar no lixo. Só atrapalhariam a distância do arremesso, com tanta porcaria para aumentar o atrito com o ar; além disso, criariam mais atrito devido à força das águas, impedindo a percepção das beliscadas dos peixes. Em poucas palavras, falou que em pesca de praia só é necessário a vara, molinete, linha, anzol, chumbada, isca certa...e conhecimento pra juntar tudo isso e usar de forma precisa.

 

Ele ofereceu-se para me ensinar, o que, prontamente, aceitei. Até então eu não tinha certeza de que ele sabia o que falava, mas que opção eu tinha? Arrisquei. E valeu a pena. Eu estava falando com o saudoso senhor Henrique Davinni, o dono das Casas Âncora naquela ocasião, uma das maiores casas de pesca de São Paulo. Era um pescador com anos de experiência em pesca de praia na Europa e no Brasil. Que sorte grande!

 

Bom, eu poderia escrever muito sobre aquele que se tornou meu grande amigo e companheiro de pescarias, e que vivia dizendo para mim: "Você sabe onde está o peixe!" Foram muitas emoções, belos exemplares de diversos tipos de peixes e bons amigos que começaram a aparecer na minha vida de pescador, sempre enriquecendo meus conhecimentos e contribuindo com pescarias cada vez mais produtivas e agradáveis. Mas eu disse no início deste artigo que meu objetivo é contribuir com minha experiência; então vamos ao conhecimento resultante do contato com grandes pescadores e muita, muita prática.

 

Não abordarei os aspectos técnicos minuciosamente, pois já existem boas literaturas sobre a maioria das informações aqui descritas; mas detalharei sobre os aspectos que considero fundamentais para facilitar a pescaria e torná-la produtiva, com dicas que dificilmente são encontradas em outros textos. E estas dicas fazem a diferença na hora de contar os peixes!

Equipamento básico

Para começar, você precisará de uma vara surfcasting, próprias para pesca de praia, e de ação média, por proporcionarem mais "elasticidade" no movimento do arremesso, assim, garantir grandes arremessos. Com comprimento em torno de 3,5 metros, pode ser uma telescópica mista de fibra de vidro com carbono, mais barata; as de carbono de dois ou três elementos são mais eficientes, mas são mais caras. Inclua um bom molinete de ação média, que tenha grande capacidade de armazenamento de linha, adequado para pescas de longa distância, com linha monofilamento entre 0,28-0,33mm, e líder (arranque) em torno de 10 metros de linha monofilamento entre 0,35-040mm. Detalhe importante: quanto mais fina a linha do molinete, menor o atrito e, consequentemente, mais longos serão os arremessos.

O chicote, que deverá ser feito com linha de igual bitola do líder, pode ter dois ou três anzóis - vai depender do casting(1) da vara e da relação de peso entre o tamanho de chumbada e das iscas.  Por exemplo, para uma vara de casting igual a 60-150, você pode usar uma combinação de chumbada e iscas que esteja dentro dessa escala. 

(1) Casting: Há literaturas que chamam de casting o peso das iscas; outras, o peso da chumbada. Mas o correto é "capacidade de arremesso", que inclui chumbada mais as iscas.

 

A não ser que você pretenda capturar peixes que possam cortar a linha, o que não é muito comum em pesca de praia, faça as pernadas do chicote somente com laços e nós na linha do "corpo" do chicote. Você terá uma estrutura econômica, eficiente e prática, como a que sugiro a seguir:

Montagem do chicote

Vamos começar pelo nó para colocação da chumbada. A forma mais fácil e prática é utilizar um nó para isca artificial sem snap (alfinete), adaptado para chumbada, que possui ótima resistência, conforme a figura 1. Faça o nó mantendo um laço com 15 cm de linha, pois assim o laço terá o tamanho certo para ser usado em vários tamanhos de chumbada. Você pode usar o nó de laçada dupla (figura 2), mais simples de fazer, mas menos resistente. Para colocar a chumbada, estique o laço, enfie sua ponta no olho da chumbada, abra o laço e lace a chumbada, puxando para ele ficar bem justo no olho dela (semelhante às figuras 6 e 7, referente aos anzóis). Note que, desta forma, você poderá tirar a chumbada quando quiser, simplesmente afrouxando o laço.

Figura 1 - Nó mais resistente para snap                                                               Figura 2 - Nó de laçada dupla

Depois, deixe um espaço de 20 cm e faça a primeira pernada de aproximadamente 10 cm de comprimento com o nó para pernada (figura 3), da seguinte forma: dobre a linha, torça as duas partes utilizando o polegar e o indicador de cada mão até obter o efeito do 1o desenho da figura, com 10 cm de comprimento; segure com a boca a ponta e coloque as duas partes da linha em paralelo, enrolando uma sobre a outra (2o desenho) cinco vezes, mantendo um laço central; passe a ponta pelo meio desse laço (3o desenho), estique bem as duas extremidades da linha para apertar o nó, enquanto puxa a ponta com a boca. Assim finalizará a primeira pernada, que ficará perpendicular à linha central do chicote (4o desenho).

Figura 3 - Nó para pernada

Monte mais uma ou duas pernadas também com 10cm com o mesmo nó, com o cuidado de manter entre eles um espaço com aproximadamente 30 cm. Dessa forma, depois de montado o chicote, os anzóis não se enroscarão. Para finalizar, amarre um snap(2) (alfinete) com o nó trilene, o melhor para amarração de giradores e snaps (figura 4) ou o de laço duplo, mais comum para anzóis (figura 5), há aproximadamente 15-20 cm da última pernada. Ele será preso no girador que deve ser amarrado na ponta do líder (arranque) da linha do molinete.  Se preferir use o nó da figura 5, mais utilizado em anzóis, mas eficiente para snaps  de chicote também. Depois é só montar a vara, instalar o molinete, passar a linha pelos passadores e colocar a vara no suporte. Prende o snap (alfinete) do chicote no girador da ponta do líder e coloque a chumbada e em seguida os anzóis, da seguinte forma: pegue uma pernada com uma mão, e com a outra segure o anzol com a farpa virada para cima. Enfie o laço da ponta da pernada pelo lado de baixo do olho do anzol, continue até que consiga enfiar a farpa no laço (figura 6). Em seguida, puxe bem a pernada para que ela fique bem justa ao redor do olho do anzol, e pronto (figura 7). Dessa forma, o anzol estará numa posição ideal para que a isca esteja mais fácil de ser abocanhada pelos peixes.

(2) O snap do chicote suporta todo o conjunto, portanto, o nó utilizado para amarrá-lo deve ser bem resistente. Recomendo estes dois nós porque eles possuem duas voltas no corpo do snap, o que aumenta a resistência à tensão.

Figura 4 - Nó Trilene

Figura 5 - Nó de laço duplo

Figura 6

Figura 7

Existem bons anzóis no mercado, mas o que considero mais eficientes, tanto para prender os diversos tipos de isca quanto para proporcionar fisgadas mais precisas, é o tipo wide gap, o "robaleiro" 2/0 (figura 8), que prende muito bem as iscas de praia por ter a hasta longa e fisga facilmente até peixes pequenos devido a sua forma.

Figura 8 - Anzol robaleiro 2/0

As chumbadas mais comuns são as tipo "pirâmide" (figura 9), pois auxiliam a desenvolver bons arremessos e suportam bem o efeito arrasto(3) provocado pela correnteza das águas. As tipo "bomber" (figura 10) possuem aerodinâmica melhor para gerar arremessos mais longos, mas tem baixa resistência ao efeito arrasto. Recomendo uma entre 50-70 gramas para começar. Mas avalie o peso da chumbada em função do casting da vara e do conjunto do chicote, como falaremos a seguir.

 

Diversifique a estrutura do chicote em função da relação entre as variáveis que melhor determinam o seu peso (tamanho da chumbada, das iscas, dos peixes que estiveram na área e da correnteza). Por exemplo: se você tiver iscas grandes, se notar que há peixes grandes beliscando e a correnteza estiver fraca, use três pernadas com uma chumbada menor. Isso significa que você estará valorizando o tamanho da isca em função dos peixes presentes na praia e aumentando a possibilidade de captura; neste caso, a chumbada terá peso suficiente apenas para auxiliar no arremesso, já que a correnteza fraca não movimentará muito o chicote. Agora, se no mesmo exemplo houver correnteza, você poderá usar duas pernadas mas com uma chumbada mais pesada, pois precisará que boa parte do peso do chicote seja usado para manter o chicote no lugar depois do arremesso.

 

Com o tempo você verificará que existem diversas combinações de montagem do chicote, e cada uma será mais adequada para uma situação específica.

Figura 9 - Chumbadas tipo pirâmide                                                          Figura 10 - Chumbadas tipo bomber

 3) Efeito Arrasto: É a força causada pela água do mar na linha, devido ao movimento (ondas e correnteza) e ao atrito, que na pesca de praia geralmente é forte devido à grande extensão de linha gerada por grandes arremessos.  Se a chumbada não resistir a essa força, o chicote não se manterá fixo, podendo ser levado, gradativamente, a regiões mais rasas, saindo da área onde ficam os peixes.

Os giradores e os snaps devem ter capacidade de suportar o peso do conjunto. Repare que, montando a linha do líder com o girador, e o chicote com o snap, você poderá montar e desmontar o conjunto da vara quando quiser, tornando mais seguro e prático o transporte do equipamento.

Agora vamos à parte complementar do equipamento de pesca:

 

  • Faca: ou um canivete, que será usado para trabalhar as linhas iscas, e peixes, se necessário;

  • Alicate: para manutenção, retirada de anzóis engolidos pelos peixes, cortar ferrões, etc;

  • Sugador: para caça de corruptos e sarnambis;

  • Suporte de descanso: para ser instalado na linha da água da praia e facilitar a utilização das varas no momento de troca de iscas e reparos. Também serve para o armazenamento do porta-iscas, samburá e etc;

  • Elastricô: para amarrar as iscas nos anzóis, melhorando sua fixação;

  • Samburá: porta peixes;

  • Porta-iscas: para manter as iscas capturadas estocadas. Recomendo um recipiente prático e barato: uma garrafa plástica pet lavada e cortada, formando um pote. Faça dois furos em dois extremos simétricos da boca do pote e amarre um barbante que servirá de alça longa. Coloque um pouco de areia e água para manter as iscas vivas e pronto. Coloque a alça transversalmente no corpo e poderá trabalhar com o sugador sem dificuldades. Um outro porta-iscas, opcional, do tipo pequeno e de cintura, pode ser utilizado para evitar de voltar toda hora ao suporte de descanso para trocar as iscas.;

  • Estojo pequeno: Para armazenar anzóis, chumbadas, giradores e snaps reserva, assim como elastricô, lâmina e alicate de bico. Este estojo não precisa ser de um tamanho que caiba tudo. Ele pode ser bem pequeno, suficiente para colocar anzóis, chumbadas, giradores e snaps. Nesse caso, utilize uma saco de naylon ou similar pequeno para colocar o estojo, o elastricô, a lâmina e o alicate, e pendurá-lo no suporte das varas;

  • Tábua das marés: Para conhecer os melhores horários e lua para a prática da pescaria;

  • Proteção: protetor solar, boné, camiseta;

  • Acessórios para descanso e conforto: cadeira de praia, guarda-sol, óculos escuros, geladeira. Não são necessários para a realização da pescaria, mas dependendo da duração o do desejo pessoal, podem tornar a aventura mais prazerosa. A geladeira, além de armazenar bebidas e alimentos, também pode ser utilizada para conservar iscas.

Iscas

As iscas para pesca de praia devem ser, preferencialmente, aquelas existentes no local, pois os peixes estão habituados a caçá-las e não hesitarão em atacá-las.

Vou relacionar as iscas por ordem de importância (foi considerado a facilidade de encontrar e capturar e a eficiência em atrair os peixes). Normalmente, costumo pescar somente com corruptos e sarnambis.

 

1. Corruptos: Parecidos com camarões, mas com a parte traseira do corpo prolongada e mole. Vivem enterrados na parte molhada da areia, mas somente na parte onde a maré cheia cobre totalmente a faixa de areia. Por isso, o momento de capturá-los é na maré baixa, quando a área onde fica a grande maioria deles não está coberta de água. Você facilmente saberá como achá-lo: aqueles "buraquinhos" que encontramos normalmente na areia são as "portas" de suas tocas. Coloque o sugador verticalmente sobre o buraco, pressione-o com uma mão contra a areia e, com a outra, puxe com vigor a haste do sifão, produzindo a sucção necessária para "sugar" o maior volume de areia possível e, assim, trazer junto o animal. Caso não consiga trazê-lo na primeira tentativa, tente mais duas no mesmo local e da mesma forma. È comum não conseguir capturar corruptos em muitos buracos, então não desanime; você terá que caçá-los por muito tempo (mínimo de meia hora) para obter uma quantidade suficiente para pescar. Tenha o cuidado de arrancar as pinças dos espécimes maiores, para evitar mordidas inesperadas, principalmente quando for retirá-los do local de armazenamento.

       → Para iscá-lo (figura 11), basta introduzir o anzol pelo rabo, enfiando até a parte superior da cabeça, mas também pode inverter a posição do corrupto, saindo com a farpa do lado de baixo da cabeça, que prende bem o anzol. Quando chegar com a ponta do anzol na cabeça, force a farpa para sair pela parte mais dura, o que facilitará que ele fique firme e à mostra, facilitando a fisgada. Amarre um algumas voltas de elastricô para manter a isca por mais tempo. Caso os corruptos sejam pequenos para o anzol, isque dois ou mais ao mesmo tempo.

Figura 11 - Colocação do corrupto no anzol

2. Minhocas de praia: Que na realidade são poliquetas, anelídeos marinhos. Muitos não conhecem esse animal, que chega a impressionar quando sai da areia com seu comprimento que pode chegar a um metro. Ela tem a carne firme, o que a torna uma isca produtiva - muitas vezes pesca-se mais de um peixe com a mesma iscada. Ela aparece em águas bem rasas, nas saídas das pequenas ondas que deixam a areia molhada e exposta. Pequenos e discretos "rastos" na areia apontam o local onde ficam (não existe um buraco, como no caso do corrupto). Para capturá-las, amarre pedaços de peixe em um pedaço de linha de naylon e passe em zigue-zague pela areia, principalmente antes do início do "rastro", no exato momento em que as pequenas ondas estiverem retornando ao mar. Assim, você atiçará o apetite da minhoca, e ela colocará a cabeça para fora tentando alcanças o pedaço de peixe com sua cabeça repleta de pequenos bigodes (escuros: minhocas mais velhas e maiores; claros: minhocas novas e menores). Nesse instante, deixe a isca bem perto de onde a minhoca está; pegue um pedaço de naylon, de um nó simples e, cuidadosamente, lace e estrangule a cabeça da minhoca, com firmeza, para ela não escapar. Ela é forte e entrará na toca mesmo assim. Porém, não tenha pressa: mantenha a linha esticada, puxando-a cuidadosamente. O laço a sufocará, e logo ela relaxará e começará a sair. Não é tão fácil quanto parece, no começo você precisará se habituar a localizar sua toca, errará a laçada, quebrará algumas minhocas... Mas é assim que começa. Temos que ter paciência e nos acostumar com as novidades do mundo da pesca. De qualquer forma, garanto que será uma experiência muito curiosa capturar esse animal. E você vai chamar a atenção de muitos curiosos, tenha certeza.

       → Para iscá-la (figura 12), introduza o anzol em uma das pontas até enchê-lo bem com o corpo da minhoca, deixando sempre a farpa à mostra. Corte-a e pronto:  não é necessário usar elastricô. 

Figura 12 - Colocação da minhoca no anzol

3. Sarnambis: Trata-se de uma concha branca e de casca frágil. Por ser leve, as ondas as levam até a zona mais rasa da praia, bem próxima da areia seca. Essa concha possui dois grandes e largos tubos que utiliza para respirar e se alimentar - essa é a principal dica para encontrar sua toca, pois ela deixa dois buracos na areia. São muito parecidos com os buracos dos vôngoles (com certeza você capturará alguns por engano), mas ligeiramente maiores. E onde você encontrar um sarnambi, haverá outros à volta. Preste atenção. A forma de capturá-los é idêntica à do corrupto. Tenha paciência, não é tão simples encontrar e capturar esse animal. Com o tempo você se acostumará e surpreenderá as pessoas - poucos conhecem esse tipo de concha.

       → Para iscá-lo, quebre a casca com as mãos mesmo. dentro você identificará um corpo branco e mole, caracterizado por duas partes distintas: uma, parecendo uma bolsa cheia, onde ficam os órgãos; outra composta pelos dois tubos acima descritos. Enfie o anzol primeiro na bolsa; depois, dentro de um dos tubos e depois do outro, e finalize espetando a farpa e deicando-a exposta para facilitar as fisgadas. Se precisar, utilize outro sarnambi. Reforce com elastricô se necessário.

 

4. Tatuíras: Mais difíceis de encontrar, esse "tatuzinhos" ariscos dão um baile na sua captura - isso porque são muito rápidos: aparecem quando as águas das ondas retornam da beira deixando a areia exposta. Porém, mau sai a água, eles correm e se enterram.  Nessa hora, cave rapidamente a areia e retire o animal. Caso a pesca não seja muito produtiva, pelo menos a brincadeira de caçar esses rápidos bichinhos será engraçada, principalmente se houver crianças envolvidas.

       → Para iscá-lo (figura 13), retire a casca do corpo e enfie o anzol até atravessá-lo na longitudinal. Utilize quantos forem necessários para esconder o anzol. Reforce com elastricô.

Figura 13 - Colocação de tatuíra no anzol

5. Camarões: Você pode usar os camarões convencionais comprados em mercados e pescadores ou adquirir os pitús vivos de água doce/salobra com os caiçaras. Porém, na praia, estes últimos não chegam a ser diferentes dos comprados em mercados, e são mais caros. Para outras modalidades, como a pesca dos robalos, eles são a mais importante das iscas. Camarões foram uma isca muito produtiva no passado, mas hoje não. Utilize-os somente se não tiver outra opção.

       → Para iscá-los, retire a cabeça e enfie o anzol pelo rabo. Quando chegar no final, espete a farpa na casca. Utilize mais de um camarão se for necessário, e amarre com algumas voltas de elastricô para garantir a firmeza da isca. Você também pode retirar toda a casca e amarrá-lo com elastricô (figura 14), principalmente quando houverem apenas peixes pequenos na área.

Figura 14 - Alternativa para colocação de camarão no anzol.

Quando Pescar

A melhor época para a pesca de arremesso abrange os tempos mais quentes, entre novembro e março. Já o período tido como o melhor, em relação à maré, começa pouco antes do reponto da maré cheia (quando não ocorre nenhuma alteração do nível de água) e vai até a metade da vazante. E isso pouco antes do alvorecer até as primeiras horas da manhã, e do cair da tarde até as primeiras horas da noite. E é importante saber também que na lua cheia os peixes aparecem com mais frequência. Também é importante citar que o melhor período para caçar iscas geralmente é quando a maré baixa estiver com altura máxima em até 0,3 metros (vide a tábua das marés) pois, acima disso, os buracos dos corruptos geralmente não são acessíveis. 

As marés alta e baixa se alteram em  um intervalo de tempo de aproximadamente 6 horas, assim, se você for caçar as iscas e pescar na mesma hora (prática que considero a melhor, pois quanto mais frescas, mais atrativas são as iscas), o tempo de pescaria será relativamente curto.

Minha recomendação é que você, primeiro, avalie a melhor época, o período e a lua para pescar. Feito isso, vá caçar sarnambis e tatuíras antes do início da maré vazante. Assim que começarem a aparecer os buracos dos corruptos, que são as iscas mais abundantes na praia, comece a caçá-los. As minhocas, que possuem carne mais resistente, você até pode caçar na tarde do dia anterior e armazená-las no freezer, assim como os camarões. Mas não se esqueça: quanto menos tempo se gasta caçando iscas, mais se pesca. E quanto mais se pesca, melhores as chances de torná-la produtiva. 

Da maneira que descrevi acima você iniciará a pescaria enquanto a maré ainda estiver vazante. Isso é ótimo, pois neste momento acontece de a força das águas levar iscas que acabam saindo de suas tocas e outros fragmentos, que servem de alimento, para o fundo. Os peixes, que instintivamente sabem disso, geralmente se aglomeram nos canais à espera dos alimentos. Esse é o melhor momento para fisgá-los, principalmente pela facilidade e segurança tanto do nosso acesso aos canais mais profundos como para executar bons arremessos. E, quando a maré começar a encher, os peixes também estarão afoitos para chegar aos pontos mais rasos, onde ficam os alimentos na areia. E esse também é um bom momento para a pescaria, mas mais difícil e menos seguro devido à força das ondas, que se tornam mais fortes nos locais onde antes íamos para arremessar, tornando mais difícil, também,  perceber as beliscada. Mas é tudo um grande desafio !

 

Praias

Existem dois tipo de praia: as rasas e as de tombo. Nas praias rasas, que são também praias de banho por terem pouca inclinação e largas faixas de areia dura, as ondas começam a quebrar longe, formando várias linhas de arrebentação  que, quanto mais ao longe da praia,  mais fortes e perigosas serão. Essas arrebentações são causadas pelos canais que existem no intervalo entre elas e que são mais fundos à medida que se afasta da praia. Daí, pode-se deduzir que, atrás de uma linha onde as ondas quebram regularmente, existe um canal, identificável como um remanso entre as ondas, uma faixa de águas menos turbulentas. É lá que devem ser arremessados nossos chicotes.

O primeiro canal, por ficar numa faixa muito rasa de ondas fracas, é frequentado por peixes pequenos, como betarinhas, corvininhas, pampinhos etc.  Somente na maré alta pode-se capturar peixes de melhor tamanho nesse local.

Existem características topográficas que diferem as praias rasas entre si, e até mesmo na mesma praia, em pontos diferentes. Por isso, apesar de ser mais produtivo arremessar o chicote no terceiro canal (mais fundo),  é possível encontrar praias ou trechos de praias onde o segundo canal já é relativamente fundo, possibilitando a captura de bons espécimes.

De qualquer maneira, para alcançar profundidades adequadas com seus arremessos em praias rasas, você terá de entrar na água e, ainda, executar lançamentos suficientemente longos. Mas não basta arremessar aleatoriamente os anzóis e ficar esperando que algum peixe morda a isca. O chicote deverá cair exatamente nos canais, onde ficam os peixes, caso contrário você cansará de esperar um bom ataque. É até possível que pegue alguns peixes fora dos canais mas, cá para nós, pescador que se presa não pode ficar na dependência do acaso ou da sorte.

E um detalhe importante: somente nas praias rasas conseguimos encontrar iscas habitando na  areia para serem capturadas.

Figura 15 - Praia rasa

Importante: Na busca pela melhor posição para arremessar e alcançar os canais mais profundos, é costume, na pesca de praia, aproveitar a maré baixa. Assim que passa uma sequência de ondas e vem uma calmaria antes da próxima sequência, aproveitamos e passamos da área de arrebentação e, desde que "dê pé", nos posicionamos e arremessamos. Mas atenção: Isso depende de habilidade (saber nadar), e de conhecer bem a praia! Se a maré estiver calma e não estiver "puxando" devido à correnteza, tudo bem. É até melhor ficar naquele local para diminuir o efeito arrasto. Porém, para permanecer naquele local, é imprescindível usar o máximo de atenção para perceber as alterações da maré: se ela está "puxando" demais na vazante, ou quando ela começa a subir, aumentando a correnteza e tornando o local cada vez mais fundo e perigoso. Na dúvida, ou arremesse antes da arrebentação, ou arremesse e volte a um local seguro. Melhor se acostumar com a interferência das ondas e da correnteza, do que corre risco de vida.

As praias de tombo, são muito inclinadas, mais fundas, e sem o mesmo esquema de canais das praias rasas. A faixa de areia é estreita, com areia fofa e grossa, e as ondas quebram com mais força bem próximas à linha d'água, ao encontrarem o barranco da praia e as ondas de retorno. Os peixes chegam a essa faixa de arrebentação bem próximos para comerem. Por isso, a pesca é mais confortável nessas praias, onde não é preciso entrar na água e ficar brigando com as ondas. Em compensação, se o peixe não estiver encostando, será necessário executar lançamentos extremamente longos.

Outra característica desse tipo de praia, que não agrada o pescador, é a inexistência de iscas na areia, ou seja, não é possível caçar nenhum tipo de isca nela. Por ser fofa, ela não permite a formação dos buracos por onde os animais se alimentam e respiram e, portanto, eles não se instalam nessa praia. Ou você caça as iscas em outra praia, ou compre iscas antecipadamente.

 

Do arremesso à captura dos peixes

Como vimos, saber arremessar bem é muito importante para jogar o chicote "onde está o peixe". Se os arremessos não forem certeiros  ou o chicote ficará em áreas sem peixes, ou será necessário recolher para arremessar de novo, o que danifica muito as iscas e gera perda de tempo. Então, destine um tempo para treinar e garantir bons arremessos. Desta forma você também evitará cruzar a linha de outros pescadores ou atingir um banhista.

Durante a pescaria, calibre a fricção do molinete em função da força das águas, e ajuste-a de acordo com o peixe que fisgar. Posicione a vara na vertical, mantendo a maior parte possível da linha fora da água e fora do alcance das ondas, o que reduzirá o atrito e facilitará "sentir o peixe" beliscando. E quando fisgar um peixe, saia lentamente até a área seca, e vá enrolando a linha, mantendo-a sempre esticada. É só lá que o peixe deverá sair da água. Já vi muito pescador afobado querendo pegar o peixe na mão dentro d'água, levar "uns tapas" e perder o prêmio.  

 

Recomendações finais

Algumas dicas para garantir uma pescaria, confortável, prazerosa e, principalmente, segura:

 

  • Prepare sua tralha antes da pescaria: confira se os equipamentos estão em ordem e se não está faltando nada;

  • Lubrifique o molinete com um silicone spray. Além de manter a boa funcionalidade, você estará isolando as juntas do equipamento, evitando a entrada de água;

  • Monte os chicotes na véspera. Isso agilizará o início e aumentará o tempo da pescaria;

  • Teste a capacidade de sucção do sugador dias antes da pescaria. Com o tempo de uso  ocorre ressecamento e deformação da junta dentro de câmara, podendo diminuir sua capacidade de sugar areia. E ele é imprescindível para a captura de iscas na praia;

  • Avalie a necessidade de adquirir iscas mortas. É muito chato planejar uma pescaria somente com iscas vivas, chegar ao local e não encontrá-las. Uma visita prévia ao local de pesca ou a compra de alguns camarões preventivamente são boas idéias;

  • Não pesque se estiver passando mau ou se bebeu muito. Melhor que querer agradar ou fazer bonito, é manter-se seguro, sem o risco de acidentes;

  • Pesque preferencialmente onde haja outros pescadores, e não se arrisque a pescar dentro d'água, em local fundo, com correnteza;

  • Em praias rasas, na época de férias, não pesque quando a praia tiver muitos banhistas ou surfistas. Por desatenção ou curiosidade das pessoas ou movimento de um peixe fisgado, pode acontecer acidentes inesperados;

  • Tenha paciência com as pessoas, em especial os curiosos. A praia é pública, e é normal as pessoas se interessarem pela pescaria, principalmente se você está caçando iscas, as quais ainda são desconhecidas por muitos;

  • Use protetor solar, boné, camiseta, tudo o que você precisar para não sofrer queimaduras. Pescar é tão bom que costumamos nos distrair, e a falta de cuidados pode estragar a aventura;

  • Ao usar protetor solar, limpe bem a mão na areia para não "contaminar" as iscas e afastar os peixes;

  • Fique atento aos equipamentos que ficam na areia enquanto você vai arremessar e pescar, evitando, assim, roubos e quedas inesperadas devido a ventos e à força das águas;

  • Evite mergulhar o molinete na água, o que poderá ressecá-lo e travá-lo;

  • As iscas que sobrarem podem ser soltas na água, pois servirão de alimento aos peixes que "se livraram de você" e aos filhotes deles; também podem ser oferecidas a outros pescadores e, dessa forma, contribuir para ter mais companheiros que podem ser aliados em momentos de lazer ou necessidade; ou podem ser levadas embora e armazenadas para outra pescaria, se estiverem em boas condições;

  • Solte os peixes muito pequenos, os filhotes de hoje serão os troféus de amanhã;

  • Quando terminar a pescaria, desmonte com cuidado o equipamento. Retire os anzóis por segurança, e lave tudo em água doce e corrente para evitar mau funcionamentos provenientes de oxidações e ressecamentos.

 

Muito bem aventureiros, espero que minhas orientações auxiliem vocês a realizarem ótimas pescarias!  E agradeço aos que deixarem comentários sobre este artigo. Boa pesca!

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